terça-feira, 16 de setembro de 2008

Encanto

Os passos eram simultaneamente decididos e amedrontados. A curiosidade e a excitação em descobrir o que aquela mulher escondia por trás da portinhola da velha casa tornava a respiração ofegante, e as tochas oscilavam. Ela era uma espécie de sereia, que aproximava qualquer homem que quisesse. Elas tinham inveja e resolveram que ela sumiria por uns tempos, até que elas descobrissem o que havia por trás de tamanho poder.

Enquanto três entravam no recinto, duas, a espreita, observavam o movimento. Na vila viviam não mais do que trezentos ou quatrocentos habitantes. Os cavalos dormiam e seus pais jamais imaginavam mulheres fora de casa àquele horário. Elas precisavam descobrir o encanto por trás de uma moça tão simples, que conseguia atrair os olhares de todos os seus pretendentes.

Já no primeiro armário, encontraram velas usadas. Vermelhas, amarelas, brancas e negras. As três se olharam, incrédulas. “Ela deve usar as luzes das velas para ficar nua na frente deles”. Um suspiro de surpresa quase fez com que gritassem. Respiraram fundo. Continuaram.

Um pouco a frente, num tacho de madeira, algumas peças de roupas. Com a ponta dos dedos, uma delas levantou uma das ceroulas que estavam jogadas no local. Os olhares falaram muito mais do que palavras. Já tinham pensado que ela pudesse ficar nua na frente dos homens, mas jamais tiveram a ousadia de imaginar que eles também poderiam estar sem roupas.

Uma delas apontou para um canto da casa. Cristas de galo, pêlos de cachorro, garrafas de colônia, essência de cravo. Tudo ali, em vidros pequenos recipientes, separados e com identificação. Soltaram um grito. No susto, a tocha se aproximou de uma parede coberta de bonecos cheios de pedaços de madeira fincados em diversas partes do corpo. Se entreolharam. Sem dizer uma só palavra, esforçaram-se para não amassar os vestidos ao sair.

Fecharam a porta. Os passos ainda mais amedrontados, e ainda mais decididos. Elas tinham descoberto que o segredo da conquista ia muito além das curvas do corpo feminino e do poder de um belo sorriso. Elas tinham descoberto a ação. E a ação é a arte milenar da conquista.

2 comentários:

Rodrigo Oliveira disse...

Já no começo me conquistou. Envolvente, só mostrando objetos em plano fechado conseguiu contextualizar época e costume. Mto bacana. Mas o última parágrafo deu um certa broxada... Achei que destoou um pouco do restante.

Anônimo disse...

eu concordo que o último parágrafo meio uqe não seguiu a linha anterior do texto... mas gostei muito do modo como vc citou principalmente as vergonhas e as incredulidades das moças inocentes, contextualizando a época.