O mundo era todo cores. Fluido, geométrico. Tinha nos olhos um brilho colorido de lilases e, de baixo da língua, escorria-lhe o sabor abstrato que dilatava-lhe as pupilas. No teto do quarto a lâmpada era um sol eclipsado enquanto ele, costas nas cobertas coloridas, era a estrela ao redor da qual rodava o mundo. Do calendário na parede saltaram cores que se espalharam pelo quarto, dançando, trocando de lugar num balé rubikiano. Era todo Kandinski, com as pupilas dilatadas olhando o calendário colorido. Viu os dias riscados, os números vermelhos de um hoje vivo.
Então a pupila contraiu-se, as curvas sinuosas endireitaram-se, as diagonais se ajeitaram paralelas. As cores se desmisturaram e agruparam-se comportadas em suas baias. O gosto se esvaía. Sob a língua, sobre as cobertas. A boca seca. Foi ficando Mondrian, Mondrian... até que todas as cores e todas as linhas se organizaram. Cubículos coloridos de uma só cor. O calendário já não parecia tão atraente. De tão Mondrian, foi-se despedaçando o azul, desbotou-se o vermelho, apagou-se o amarelo. E restaram-lhe os cubículos preto-e-brancos. As cores tinham-se ido todas. As curvas, as diagonais. Era novamente retas, apenas. Retas e cubículos. No calendário, os dias coloridos ficaram para trás. Amanhã o dia era negro.
sábado, 15 de agosto de 2009
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3 comentários:
Oieeeeeeeee.. eu voto nesse texto! he he eh Abraços a todos....
Oi, Malu! Valeu pela participação, viu? Mas como já foi comentado em um outro post mais antigo, só serão computados como válidos os votos cometados no post de votação, ok? Apareça! =)
Sai dessa vida de drogas, Rodrigo...
Sobre o comentário que tu fez no texto do Fábio, eu concordo com a questão do nome do artista. Eu preferia, pessoalmente, que tu não tivesse citado o autor, e nem que era uma pintura. Daí o tema ficaria menos na parte do "quadro do Kandinski" e mais na intepretação da figura em si (seja lá o que esse troço bizarro queira dizer...). Penso que essa é um direcionamento mais interessante para essa opção de figuras como temas (embora um tema típico nosso dizendo "pintura abstrata" também fosse perfeitamente válido).
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