Marina Melz
25 de Setembro de 2006
Cinco segundos. Esse foi o tempo da minha primeira experiência como pessoa, como ser humano, e talvez, a minha primeira experiência como jornalista que observa os fatos sem poder fazer nada para interferir na sua ocorrência. Saí do jornal para o Hospital onde eu deveria chegar à UTI e conversar com o coordenador daquele setor sobre as melhorias que haviam acontecido. Hospitais já são um tanto quanto complicados pra mim, mas resolvi encarar o desafio, afinal, nem todo medo pode ser levado por uma vida.
Chego lá, reconheço o médico (já o havia entrevistado anteriormente), vou até ele. Cumprimentos feitos, seguimos para a sala de espera para podermos conversar. Ele me explica a respeito das UTIs e do que tem sido feito para a melhoria do atendimento a pacientes em estado grave. Como na primeira entrevista que fiz com o médico, de tempos em tempos éramos interrompidos por um pedido de ajuda, de exames ou de informações sobre pacientes. Normal, a profissão que ele exerce exige esse tipo de atenção. Da sala onde estávamos tínhamos a vista completa dos seis leitos da nova UTI. Enquanto ele me explicava a respeito dos aparelhos utilizados nos procedimentos, observamos a queda do ritmo cardíaco de um paciente.
Num ato de completo instinto, o médico levantou-se, sacou o aparelho que deveria fazer com que o coração do tal sujeito voltasse a bater. Todos ali estavam tensos, eu lutava contra a minha curiosidade queria sentar-me e não ver aquela cena, mas não pude. O risco verde com o fundo preto da tela parou de apresentar qualquer oscilação. O tal sujeito acabara de falecer. Não pude conter as lágrimas que caiam dos meus olhos sem que eu tivesse qualquer tipo de controle. Senti as pernas bambas. Vi filmes, cenas, vidas passando a minha frente em alguns segundos. Parece brincadeira, e talvez a minha reação tenha sido exagerada mesmo. Mas eu não contive, não conseguiria. Foi a primeira vez que eu vi um falecimento tão de perto.
Como se num ritual lento e mórbido, todos os funcionários da UTI se uniram em torno do corpo do homem, deram as mãos. Chamada pelo médico, participei da oração que seguiu. "Trabalhamos com vidas, sabemos que tentamos de qualquer forma o salvar. Não conseguimos. Ele está com Deus. Descansa. Temos certeza que esse dia ficará marcado na história de muita gente como um dia triste. Vamos lembrar dia como um dia de mudança, daquelas que todos temos que passar".
Senti meu corpo amolecer. Sentei-me. O médico que eu até então julgava como alguém completamente racional sentou-se ao meu lado, pediu licença e me abraçou. "Você não é a primeira que tem esse tipo de reação. A vida é assim. Lidar com a vida é assim". Me acalmei e ele fez questão de me trazer à redação. No caminho, ele me explicava que independente de credo ou religião, a vida acaba do mesmo jeito pra todos. "E, por mais que a gente tente, lidar com a vida não é algo fácil". Os olhos lacrimejantes do médico não me deram dúvidas disso.
segunda-feira, 26 de novembro de 2007
Assinar:
Postar comentários (Atom)
4 comentários:
gosto muito desse texto... primeira vez que alguém posta texto 'antigo'...
que bom que existe essa possibilidade. Nenhuma nova história de "1ª vez" poderia transmitir tanta emoção quanto esta. Tocou com força do lado de cá. A realidade é sempre mais tocante que a ficção.
foi t�o confessional que d� a impress�o de ter sido uma experi�ncia pessoal... tem alguma base 'real'?
não só a base, félix! tudo de real :)
Postar um comentário