quarta-feira, 16 de julho de 2008

O menino que não podia envelhecer

Foi na sétima série que Oscar percebeu que havia algo errado com seu corpo. Que ele sempre foi o menorzinho da sala, todos sabiam. O mais baixinho, mais magrinho, com cara de criança, mesmo já tendo 14 anos. Um dia ele reparou, sem um motivo em específico, que não se lembrava da última vez que havia cortado o cabelo. Há anos ele não ia ao cabeleireiro. Tanto o médico quanto o dentista nunca acharam nenhuma doença, nenhuma cárie. E eles eram os melhores especialistas que o vasto dinheiro de seu pai podia pagar. Ele comia bem, mas não conseguia engordar. Jogava futebol com os amigos, andava de bicicleta, mas não ficou nem um pouco mais musculoso, ao contrário do restante de sua turma.

Curioso, resolveu pegar seu álbum de fotos. Seu medo se mostrou real: fazia pelo menos dois anos que ele não havia envelhecido nada. Seu cabelo continuava exatamente do mesmo tamanho desde a quinta série, e não era a toa que ele era o menor da turma. Ele não havia crescido desde então!

Oscar pensou em muitas possibilidades, mas não conseguiu achar nenhuma saída. Mais cedo ou mais tarde seus pais e amigos iriam reparar. O ano estava quase acabando e ele ia para a oitava série, com cara e corpo de um menino da quinta. Alguém iria notar.

A única saída que encontrou foi fugir de casa. Numa manhã de sábado fugiu com uma mochila nas costas para outra cidade. Lá, entrou em um hotel dizendo que seu pai só conseguiria chegar a noite, e então faria o cadastro. A atendente acreditou e lhe deu a chave do quarto. De lá, ele entrou na internet e alugou um apartamento no Centro, utilizando o nome e o número do cartão de crédito de seu pai. Ninguém suspeitaria.

Meses se passaram e Oscar se matriculou no colégio, sempre dizendo que seu pai, um homem muito ocupado, não podia se fazer presente nas reuniões. Oscar usava a senha do banco de seu pai para fazer sempre pequenos saques, de forma que o pai não reparasse que o dinheiro estava sumindo. Voltou para a quinta série, pois não podia apresentar os documentos dizendo que já estava na sétima, com medo que descobrissem quem ele era, antes que descobrissem que ele não podia envelhecer. Passou a chamar-se Dorian e era o melhor aluno de sua sala.

Na sétima vez que cursava a quinta série, já no sétimo colégio diferente das quatro cidades que já havia morado desde que fugiu de casa, Oscar entediou-se e passou a viver uma vida reclusa dentro de casa. Esqueceu de sua família, seu colegas e das risadas. Não via mais graça em vídeo-games, histórias de terror ou em jogar mata-soldado. Não desenhava mais, não mascava chicletes e não sorria.

Oscar, enfim, envelheceu.

7 comentários:

Anônimo disse...

*dúvida*

Só se envelhece quando pára de viver?

Marina Melz disse...

E quando ele percebe que envelheceu, foi feliz?

Thiago Floriano disse...

quando li teu texto, primeira coisa que pensei foi: coitado do guri, se reprimindo por ser diferente, vai acabar se tornando um igual... muito bom!

Rodrigo Oliveira disse...

magavilha! duca. construção bem envolvente, final bem estruturado e um ponto final poderoso. é assim q se faz.

Vivi disse...

Gostei do encadeamento de texto e contexto. O que marcou foi a postura de Oscar em negar-se a si mesmo e ao final chegar-se a conclusão de que é o espírito, e não a aparência exterior, que envelhece.

D. Lopes (@dessine) disse...

oscar nunca ouviu ramones.

Yke Leon disse...

Muito bom!
O texto todo enrolado, bem escrito, muito bom mesmo!
Parabéns Fábio Ricardo!

Yke Leon, do www.revolutear.blogspot.com