domingo, 7 de dezembro de 2008

Sobre a fome

Ele acabara de chegar ao continente de gelo. Mal conhecia o lugar e já estava faminto. Esqueceu de estocar comida. Esqueceu que ia demorar até alguém aparecer àquele lugar para trazer mantimentos. Não tinha experiência em caça, afinal, sempre a condenou. Sempre foi ligado às questões ambientais, mas dessa vez não haveria jeito. Sem árvores frutíferas ou qualquer tipo de vida vegetal, tudo que lhe restava eram os animais. A solução era matar ou morrer.

Pegou uma pá e saiu em busca de comida. Avistou um leão-marinho, mas percebeu que seria muito difícil golpeá-lo com aquela arma improvisada. Talvez conseguisse uma foca. Caminhou procurando qualquer coisa que pudesse servir ao propósito de alimentá-lo. Era uma tarefa difícil. Foram longas horas de caminhada até avistar um grupo de pingüins andando desordenadamente, empurrando uns aos outros. Aproximou-se e sentiu o vento cortar-lhe a espinha. O lugar era frio por natureza, mas a idéia de matar pingüins para saciar a fome era ainda mais gélida.

Pensou por alguns instantes. Se perdesse aquele grupo talvez não encontrasse mais nenhum sinal de vida nos próximos meses. Suas ponderações ecológicas foram completamente esquecidas e, como se tivesse possuído por uma cólera súbita, começou a desferir golpes certeiros nas cabeças daquelas pequenas criaturas alvinegras. Um a um, os pingüins sucumbiam à força da fome de um predador voraz. E ele teria comida suficiente (e de sobra) para alguns meses de isolamento.

3 comentários:

Medéia (Carlena) disse...

De certa forma uma justificativa e não uma crítica.
Gostei do enfoque.
Com uma foto como aquela o normal seria criticar a matança e você conseguiu, de certa forma, justificar.
Parabéns!

Rodrigo Oliveira disse...

Ao contrário da Medéia, não vejo tanto uma justificativa. Só acho q a crítica tomou outro alvo. Lembrou um pouco uma passagem do Ensaio sobre a Cegueira em q os cegos de uma camarata pegam pra si a comida q chega. Não lembro o texto mas é algo como que eles não eram mais civilizados, tudo q eram era cegos com fome, ou qq coisa do gênero. Passagem poderosa aquela.

Vivi disse...

Retratou bem a irracionalidade como consequência de uma situação que foge ao controle. Muito bom mesmo!!!!