sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A não história

A música que você não fez sobre o nosso amor que nunca existiu foi minha trilha sonora todo o dia. Senti uma saudade quase louca de todas as noites que eu não passei olhando você dormir e da sensação de paz que nunca senti ao teu lado. Vi as fotografias que não tiramos das viagens que não fizemos e senti saudades do cheiro da sua nuca. 

Lembrei daquela festa bacana que nós não fizemos. Os amigos que não tivemos, o som que não ouvimos juntos e os cafés bacanas que nunca concretizamos. E aquele casamento? Acho que a festa do casal de melhores amigos que nunca tivemos foi a festa mais divertida da nossa falta de história. Sua gravata e meu vestido, que nunca existiram, combinavam tanto quanto o seu gosto musical e o meu.

A cara que você não fez no primeiro dia que você acordou na minha casa que nunca existiu não poderia estar de fora dessas lembranças. Aquele dia das horas se espreguiçando que nunca existiram, da guerra de travesseiros que não tivemos e da decisão que não tivemos de assistir um dos filmes que nunca compramos comendo um dos brigadeiros que você nunca fez.

Impossível esquecer também aquele show que você não fez. A sua declaração de amor de que nunca existiu seguida dos versos que você nunca cantou e o público, aquele público que nunca esteve em lugar algum, aplaudindo quando eu disse sim ao seu pedido que não existiu. Aí eu lembrei sabe do que? Daquelas pegadas que não ficaram na areia no dia que nos não trocamos alianças do nosso jeito, sozinhos e com todo amor do mundo, que nunca sentimos. 

Eu lembro perfeitamente da nossa casa que nunca existiu. Os quadros que nunca tivemos dos nossos ídolos misturados com os discos, filmes e livros que eu nunca soube se eram meus ou teus, e que no final nunca foram de ninguém. A nossa vontade que nunca existiu de aproveitarmos o nosso final de semana em casa recebendo amigos, comendo pizzas assistindo as comédias nacionais que nunca vimos.

E aí, quando me bateu um medo violento do mundo, seu abraço que nunca existiu era o único capaz de conseguir me fazer acreditar. O jeito intenso de me fazer perceber que você sempre estaria ali nunca foi sua marca mesmo. E eu levava o computador para a cama grande que nunca tivemos e nós escrevíamos juntos aqueles textos bonitos que nunca existiram. 

Lembro exatamente do dia em que eu não descobri que você seria o homem perfeito pra mim. Quando eu não peguei na sua mão, nem olhei no fundo dos seus olhos que não pareciam ainda mais azuis, e não disse que te amava. De quando você não me pediu perdão por ter medo de amar, mas não falou que mesmo assim não queria mais viver longe de mim. 

Nossa história é aquela que nunca existiu. É uma quase não história. Mas eu vivi na cabeça tantas vezes cada um desses momentos, que eu até esqueço que só aquela que eu não fui, acompanhada daquele que você nunca foi, seriam capazes de viver um conto de fadas de verdade.

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Escrito em 03/12/2008.

7 comentários:

Anônimo disse...

Isso me lembra vagamente Florbela Espanca:
"Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê..."

Gostei.
Abraços Luzia

Félix disse...

uma ótima abordagem para o tema "histórias que são vividas apenas na cabeça". faço isso direto, eu já não disse muitos "eu te amos"! :)

o texto ficou bem legal, só com dois comentários. um era que dava para enxugar alguns "nãos" e "nuncas" que se repetem em demasia em alguns trechos. o outro seria que, para a conexão com o tema ser reforçada, a festa de casamento poderia ser deles e não do casal de amigos. isso mostra que a narradora imagina eles casados e não apenas juntos.

Schali Loureiro disse...

Marina, acho esse seu texto maravilhoso. Sou uma das que aderem ao estilo "eu vejo nós dois juntos naquele dia que não existiu"! hehe

Parabéns!

JLM disse...

excelente idéia e texto, marina. só alguns trechos soaram repetitivos - e não falo das denegatórias - q se vc ler em voz alta vai perceber melhor e corrigir.

acho q será a primeira vez q vou votar em vc, oq ja tava pressentindo antes, deve ser algo q seu texto irradiou antes de eu lê-lo. coisas literárias, eu acho.

Lori disse...

Marina, você contou uma história que não existiu incrivelmente....meus Parabéns....amei...bjus Elis

Anônimo disse...

Imagine aqui um comentário bem bacana, que eu nunca escrevi.

Anônimo disse...

Muito bom, Marina. Poderia ser um pouquinho mais curto, talvez, mas a abordagem, criativa e contraditória, foi perfeita. Nota 10! Êpa... eu disse nota? Que é isso...