sábado, 16 de fevereiro de 2008

Fingidores anônimos - ou não

Marina Melz
16/02/2008

Não era lá um ambiente muito agradável, mas jamais esperei o contrário. Mulheres semi-nuas, cigarros, pilhas de fichas. Era um cassino como eu imaginara e como via todos os domingos num canal de TV a cabo, quando assistia o campeonato internacional de poker. Demorara muito até que resolvi ir até lá. Sorte e azar se contrapunham na minha vida de forma espetacularmente estranha, e poderia ser da mesma forma agora, numa mesa de jogo.

Eu era prostituta, mas odiava aquilo. Ao mesmo tempo em que adorava. Viciara-me em fingir orgasmos, mesmo sabendo que tinha a possibilidade de tê-los, já que essa não era lá minha maior dificuldade. Queria ser atriz, por isso resolvi treinar nas mesas de jogo e nas camas de motel.

Mas, voltando ao cassino. Queria arriscar-me. Descobri que para entrar numa mesa de jogo precisava se inscrever com um dos caras vestidos de pingüim. Ri ao imaginar um daqueles na cama – criei o hábito de pensar em todos nus quando via homens em geral.

Depois de dois copos de uísque com gelo, sentou-me. Encarei bem os homens a sua volta. Dei um piscada discreta pra um deles e me concentrei nas cartas.

Primeira dupla: um ás e um rei de espadas. Paguei o big blind e permaneci na mesa apenas com mais dois competidores. Jamais esquecerei aquela dupla. Primeiras três cartas viradas. Um ás e um rei de copas. Respirei fundo, fiz cara de quem comeu e não gostou. Ensaiei uma desistência. Ah, garota fingida, é foda. Paguei. Todos a minha volta pagaram imediatamente. Quarta carta, um dois de espadas. Ninguém reviu suas apostas. Quinta carta, mais um rei, desta vez de ouros. Acumulei 190 reais para a noite.

Única mulher em todo aquele salão, já bebido algumas doses. Estava me sentido a mais ganhadora pessoa do mundo. E, de fato, naquele momento eu era. A partir deste dia, todas as quintas-feiras saio de lá com um valor com pelo menos quatro dígitos.

Fiquei milionária. Mas ainda gosto de fazer programas. E ainda quero ser atriz. Descobri que o vício da minha vida não eram homens em fichas. Era ganhar dinheiro fingindo. E dele eu realmente não quero me livrar.

“Só por hoje eu quero ganhar dinheiro nas costas dos outros. Só por hoje quero fazer cara de coitadinha. Só por hoje quero me sentir a melhor cara de pau da história”.

Todos aplaudiram, encerraram a sessão e foram para a mesa de jogo.

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