Hoje nasce o primeiro filho de um de meus netos. Sou extremamente reticente em crer que serei bisavô, então fica difícil chamá-lo de bisneto. Parece que foi ontem que conheci a mãe dos meus filhos, mas na verdade já se passam exatos cinquenta anos. Naquela época ainda se fazia parto por cesariana. Aliás, geralmente optava por essa modalidade quem tinha dinheiro, o que dava uma boa vantagem a quem não tinha dinheiro pelo menos na hora de nascer. Eu estava falando de crianças. Elas são sempre muito engraçadas por sua curiosidade.
Certa vez, estava eu na casa de uma tia quando meu primo caçula pegou um disco de vinil e perguntou: “Mãe, o que é esse CD gigante?!”. Quem esperaria que hoje o CD não existe mais e ouvimos música em vinil novamente? Para muitos era impossível imaginar isso. Mais recentemente um de meus netos chegou em minha casa, olhou para a televisão e perguntou: “O que é essa corda atrás da TV, vô?” Ele se referia ao cabo de energia, que já deve ter virado peça de museu há cerca de vinte anos. Mas estas questões tecnológicas não são o mais importante. O mundo mudou mesmo é nas relações.
Há cinquenta anos as tendências de comportamento já davam demonstrações de que teríamos uma nova era pela frente. A banalização do divórcio foi só o começo. Em pouco tempo a estrutura familiar já nem lembrava aquela que conhecemos no final do século XX. Hoje temos as instituições completamente enfraquecidas a não ser pelo estado, que deu uma reviravolta surpreendente após o colapso econômico de 2008. Família? Religião? Como eles eram fortes naquela época. Agora, pouco se ouve falar.
Mas e as relações interpessoais? As relações de trabalho? E o sexo? Nada se manteve inalterado. Afinal, com todo o avanço da ciência, cinquenta anos são uma eternidade. As pessoas hoje, juro, estão mais amáveis do que naquela época. Algo que minha mente idosa ainda não conseguiu compreender, mas agradece. As relações de trabalho realmente se alteraram de tal forma após as seguidas crises econômicas que, em determinado momento, parecia que os papeis se inverteriam, dando grande força ao proletariado. Doce ilusão. Neste aspecto tudo é muito parecido com o início dos anos 2000, a não ser pela obrigatoriedade de parar de trabalhar após a aposentadoria, que agora é levada a sério.
O sexo? A banalização foi crescente e intensa no período entre as décadas de 20 e 30, com grande estímulo da mídia para situações puramente sexuais sem a mínima sensualidade. Aos poucos, pequenos grupos começaram a tentar resgatar a sensualidade sem ser puritanos. Ninguém estava ali para negar o sexo, apenas torná-lo ainda mais prazeroso e intenso. Foi assim que o mundo ocidental começou a dar valor aos antigos ensinamentos orientais, incorporando técnicas milenares que sofriam enorme preconceito até 2035.
João Pedro Cândido de Pangloss
06 de abril de 2059
terça-feira, 7 de abril de 2009
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3 comentários:
o papo sobre sexo me lembrou que lá, em 2050, estaremos na era de aquário (:
tava indo bem. o papo ali sobre banalização, me parece q destoou um pouco. mas as ideias de retorno até foram interessantes.
Já que o Félix comentou o próprio texto, também vou entrar na onda. O desfecho está oculto na assinatura. Porém, não explicarei antes da votação por questões lógicas. Afinal, acredito que um bom texto tem que ser compreendido (pelo menos em parte) mesmo se a pessoa não conseguir decifrar o que está oculto. Como o duelo é um constante exercício, arrisquei.
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